Entre a aldeia e a cidade
Desde o primeiro ano em que esta se realiza, costumo passar por lá. Além das ligações familiares à vila, gosto do ambiente da Feira. Gosto das manifestações da cultura popular. Dos cantares ao desafio e dos ranchos folclóricos; do artesanato tosco e dos restaurantes típicos – vinho tinto servido em malgas e enchidos. Gosto dos produtos da terra – o vinho verde, as frutas, os vegetais e o gado.
E gosto de algumas manifestações do kitsch que por lá se encontram.
Uma dessas manifestações está documentada pela foto. Explicações secundárias? Para quê? É o duvidoso gosto popular – e a recorrente associação fálica dos vegetais – na sua mais perfeita demonstração. É o grotesco puro aos pés do santo da devoção local – e é aí que me encanta a religião, nas suas manifestações populares: tão pouco canónicas e tão pagãs. É o povo que olha deliciado, os comentários machistas… Pode parecer estranho, mas gosto deste mundo. Gosto de saber que somos capazes de rir de nós próprios de uma formas tão desprendida.
Mais abaixo, no mesmo espaço, a banca do mestre Zé. Construtor e vendedor de bombos. E eles – os bombos – lá estavam: peles curtidas e aros bem fixos. Na banca dois miúdos. 13 ou 14 anos. Provavelmente netos do mestre.
Naquele cenário de ritualização da ruralidade, havia uma nota que destoava. Os dois miúdos ouviam hip-hop. Tentavam vender bombos ao som de um beat bem diferente daquele que as peles proporcionam.
Símbolo máximo do movimento-urbano – a par dos graffiti – aquela manifestação artística fora do contexto tem o seu quê de kitsch. E não deixa de ser divertido que os “putos” abanem a cabeça ao som de umas rimas, perante o olhar dos “vizinhos”: a vendedora de mel e chás e o artesão que vendia gaiolas para pássaros.
E este sinal de pós-modernidade em plena manifestação tradicional tem o seu quê de interessante. Provavelmente até vou voltar a ela aqui neste espaço.
0 reacções:
Enviar um comentário